Fim de tarde.
No céu plúmbeo
A lua baça
Paira
Muito cosmograficamente
Satélite
Desmetaforizada,
Desmistificada,
Despojada do velho segredo de melancolia
Não é agora o golfão de cismas,
O astro dos loucos e dos enamorados
Mas tão-somente
Satélite
Ah lua deste fim de tarde
Demissionária de atribuições românticas,
Sem show para as disponibilidades sentimentais!
Fatigado de mais-valia,
Gosto de ti assim:
Coisa em si,
_Satélite
Manuel Bandeira
terça-feira, 30 de junho de 2009
terça-feira, 2 de junho de 2009
Philo-sofia vazia
Vazio:
flocos de vidro extracorpóreos,
invisíveis estigmas estilhaçados,
nos penetram em
d o ---s --------e------------------ s
[homeopáticas.
O grito sufocado, ânsia muda
alheio aos sentidos do mundo,
alheio às sinapses do corpo,
alheio aos apelos da vida.
Ataráxicos, apoiamo-nos
em filosóficas muletas irreais.
Não somos apenas sombras
de perfeitos mundos ideais?
Consome-nos, rio de cicuta
eticamente calmos, humanamente rígidos
-e o kósmos, paradoxalmente desordenado-
e o conhece-te a ti mesmo ficará esquecido.
Cecília
flocos de vidro extracorpóreos,
invisíveis estigmas estilhaçados,
nos penetram em
d o ---s --------e------------------ s
[homeopáticas.
O grito sufocado, ânsia muda
alheio aos sentidos do mundo,
alheio às sinapses do corpo,
alheio aos apelos da vida.
Ataráxicos, apoiamo-nos
em filosóficas muletas irreais.
Não somos apenas sombras
de perfeitos mundos ideais?
Consome-nos, rio de cicuta
eticamente calmos, humanamente rígidos
-e o kósmos, paradoxalmente desordenado-
e o conhece-te a ti mesmo ficará esquecido.
Cecília
Andanças de um zé Ninguém.
Era um domingo de sol o dia do nascimento de José Pinto Ferreira Marques. O céu azul refletia o celeste dos olhos do recém-chegado, o qual os mantinha arregalados- como quem esperasse absorver todo o novo mundo de uma só vez pelas pupilas ansiadas. Quando bebê, não chorava. Os esporádicos berreiros, contudo, deixavam os cabelos de sua mãe em pé. Era diferente de outros meninos de sua pequenez; parecia tão esperto, tão absolutamente alegre!
Crescia rápido o menino. Filho de importante juiz de uma cidade do interior, estudou em bons colégios - todos eles incapazes de domar sua personalidade arteira e particularmente destruidora. Certo dia, quando era aluno do Colégio Dom Bosco, defecou no carro de um dos padres que lhe desagradava. No dia de sua expulsão, a escola inteira instalou o luto; cartazes apareceram na parede: volta, gangue do zezé!. O medo de uma revolução ocupou os párocos por meses a fio.
Depois de alguns anos foi cursar direito no Rio de Janeiro. Zé Pinto,figura conhecida das noites cariocas, participou de rodas de samba com assiduidade. Chegou a ser mestre sala da Mangueira, impressionando a todos com seu molejo descolado. Em uma das idas à praia da Barra, conheceu Maria de Lourdes. Ele soube, no momento em que ouviu sua voz, que estava apaixonado. Fez de tudo para chamar a atenção da morena, mas a conquistou com apenas um sorriso. Não qualquer sorriso, os dentes brancos e alinhados de Zé Pinto quando à mostra tinham algo de especial - uma graça irresistível.
Casaram-se. Após um ano de união tiveram um filho, a quem chamaram Gabriel: um anjo que guardava os olhos do pai. José Ferreira Marques trancou a faculdade e resolveu sustentar a família: virou taxista. Depois de alguns anos, contudo, gastou todas as suas economias para deaurar o canino esquerdo. Divorciou-se de Maria de Lourdes, quem já estava cansada de suas bebedeiras após o expediente.
O que aconteceu depois pouco se sabe. Especula-se que tenha morado no Nordeste, onde ficou conhecido como Izé, um trambiqueiro de marca maior. No aniversário de vinte anos de seu filho, contudo, mandou uma carta contando suas experiências como pastor no Amazonas, onde fundara uma religião. A carta voltou com uma notícia fúnebre: seu anjo dos olhos anis enfim subira aos céus - dois anos antes- em uma boate na zona sul do Rio.
Celebrou uma cerimônia em homenagem ao herdeiro falecido, e mergulhou na bebida novamente. Certo dia, um mendigo, a quem Zé contava sua história, perguntou-lhe:
_ Como foi que ocê, com tudo pra ser feliz, pode virar um zé ninguém?
José Pinto Ferreira Marques, Zezé, Zé Pinto, José F. marques, Izé, e tudo que aquele homem de cabelos brancos já tinha sido na vida responderam em uníssono:
_ Quem disse que eu queria ser "alguém" feliz? Sou tudo que eu sempre quis: um Zé, feliz. O ninguém é por sua conta...
Morreu de cirrose alguns anos depois. Diz-se que no enterro os lábios desenhavam um sorriso torto. Como a vida, deveria estar levando a morte como uma piada...
Baseado em fatos reais.
Rebeca
Crescia rápido o menino. Filho de importante juiz de uma cidade do interior, estudou em bons colégios - todos eles incapazes de domar sua personalidade arteira e particularmente destruidora. Certo dia, quando era aluno do Colégio Dom Bosco, defecou no carro de um dos padres que lhe desagradava. No dia de sua expulsão, a escola inteira instalou o luto; cartazes apareceram na parede: volta, gangue do zezé!. O medo de uma revolução ocupou os párocos por meses a fio.
Depois de alguns anos foi cursar direito no Rio de Janeiro. Zé Pinto,figura conhecida das noites cariocas, participou de rodas de samba com assiduidade. Chegou a ser mestre sala da Mangueira, impressionando a todos com seu molejo descolado. Em uma das idas à praia da Barra, conheceu Maria de Lourdes. Ele soube, no momento em que ouviu sua voz, que estava apaixonado. Fez de tudo para chamar a atenção da morena, mas a conquistou com apenas um sorriso. Não qualquer sorriso, os dentes brancos e alinhados de Zé Pinto quando à mostra tinham algo de especial - uma graça irresistível.
Casaram-se. Após um ano de união tiveram um filho, a quem chamaram Gabriel: um anjo que guardava os olhos do pai. José Ferreira Marques trancou a faculdade e resolveu sustentar a família: virou taxista. Depois de alguns anos, contudo, gastou todas as suas economias para deaurar o canino esquerdo. Divorciou-se de Maria de Lourdes, quem já estava cansada de suas bebedeiras após o expediente.
O que aconteceu depois pouco se sabe. Especula-se que tenha morado no Nordeste, onde ficou conhecido como Izé, um trambiqueiro de marca maior. No aniversário de vinte anos de seu filho, contudo, mandou uma carta contando suas experiências como pastor no Amazonas, onde fundara uma religião. A carta voltou com uma notícia fúnebre: seu anjo dos olhos anis enfim subira aos céus - dois anos antes- em uma boate na zona sul do Rio.
Celebrou uma cerimônia em homenagem ao herdeiro falecido, e mergulhou na bebida novamente. Certo dia, um mendigo, a quem Zé contava sua história, perguntou-lhe:
_ Como foi que ocê, com tudo pra ser feliz, pode virar um zé ninguém?
José Pinto Ferreira Marques, Zezé, Zé Pinto, José F. marques, Izé, e tudo que aquele homem de cabelos brancos já tinha sido na vida responderam em uníssono:
_ Quem disse que eu queria ser "alguém" feliz? Sou tudo que eu sempre quis: um Zé, feliz. O ninguém é por sua conta...
Morreu de cirrose alguns anos depois. Diz-se que no enterro os lábios desenhavam um sorriso torto. Como a vida, deveria estar levando a morte como uma piada...
Baseado em fatos reais.
Rebeca
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