quinta-feira, 12 de março de 2009

Para José

Sei que quando me voce me viu pela primeira vez, voce me julgou como um caderno em branco: puro. E sei bem que queria escrever em mim, me marcar, fazer umas orelhinhas e quem sabe até derramar algumas gotas do seu café mal adoçado. Nao posso culpar ninguém por ter desejado o que é comum, afinal, é exatamente essa a vontade que eu teria me colocando em seu lugar.
O que eu nao consigo compreender, José, é porque voce quer me escrever apenas mais uma página e não continuar sua trama. Fico agora ansiosa, esperando pelos próximos capítulos, próximos fatos, os quais cada dia mais demoram para vir. Minhas linhas, minhas margens estão atrapalhando seu processo de criação? Sou exatamente a mesma durante toda a minha extensão. O que aconteceu com aquela inevitável necessidade inicial de escrever? Era o meu cheiro de papel recém encadernado que o motivava?
Observo os outros cadernos da estante: rabiscados, mal cuidados, encapados, incompletos, cheios de outros papeizinhos, molhados até abandonados. Não sei qual a sensação se ser um caderno de estudos, ou uma agenda. Mas você me começou uma história. E eu estou ansiosa pela sua continuação.
Sabe, só de pensar que um dia você vai me esquecer ou não conseguir mais me continuar, já me desespero. Me desespero também ao pensar que você possa transformar essa linda comédia que me vem escrevendo em tragédia.
Me sinto mal também ao ativar meu senso crítico e perceber que ter lhe transformado em escritor foi uma idéia absolutamente autorizada por mim. Minha submissão a voce por exercer simples papel de livro me abala ainda mais, pricipalmente por saber que parcela da culpa do meu sofrimento provém, em partes, de mim mesma.
Aaah, José, se você soubesse o esforço que eu faço para te inspirar, colocar minhas idéias em sua mente e esperar que você as transcreva em mim, conheça minhas vontades e faça de minha palidez a palidez mais bem escrita já conhecida pelos homens... Se você soubesse do meu esforço mudo para te fazer feliz ao me escrever... Se você tivesse pelo menos idéia da minha satisfação ao vê-lo escrever com carinho e, com seus olhos inteligentes, me flertar como se me agradecesse por algo que seu lado racional por completo atribui a glória apenas a si mesmo...
Alguns escritores dizem que não escreveram sua obra, mas que a própria obra se escreveu através dos punhos do escritor. Sei que não é nosso caso. Você me escreve de acordo com suas vontades, suas idéias, seu humor. E eu fico aqui, esperando que algum dia eu possa entrar em você da mesma forma que um dia você entrou em mim para que, assim, ao continuar a sua escrita, você me despeje não o que lhe surge ao acaso, mas o que nos brota espontaneamente, como dupla, como cúmplices.


Sonia Maria Lima da Rosa

Um comentário:

  1. Sou eu que vou seguir você
    Do primeiro rabisco até o be-a-bá.
    Em todos os desenhos coloridos vou estar:
    A casa, a montanha, duas nuvens no céu
    E um sol a sorrir no papel.

    Sou eu que vou ser seu colega,
    Seus problemas ajudar a resolver.
    Te acompanhar nas provas bimestrais,
    você vai ver.
    Serei de você confidente fiel,
    Se seu pranto molhar meu papel.

    Sou eu que vou ser seu amigo,
    Vou lhe dar abrigo, se você quiser.
    Quando surgirem seus primeiros
    raios de mulher
    A vida se abrirá num feroz carrossel
    E você vai rasgar meu papel.

    O que está escrito em mim
    Comigo ficará guardado, se lhe dá prazer.
    A vida segue sempre em frente,
    o que se há de fazer.
    Só peço a você um favor, se puder:
    Não me esqueça num canto qualquer.

    escreva, josé...

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